segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

LENÇO


Abriu a gaveta e o suave aroma do lenço invadiu-lhe a alma, aturdindo-a. Sorriram. Felicidade recíproca transbordou daqueles corações...havia laços…
- Gostaria de ter um abraço teu, mas sinto-te tão frágil… - disse, em trémulo tom de voz, a Maria José.
- Os anos passam, minha querida! Já protegi cabelos e adornei donzelas. Mas a fraqueza apoderou-se de mim, estou mais débil mas tento continuar fiel à família… espero que por longos e duradoiros anos. Ajudas-me ? – retorquiu o lenço.
- Claro, eternamente cúmplices! – balbuciou a Maria José.
- Recordo-te que caminhei muitas léguas, cruzei o rio, conheci outras vidas, convivi com momentos de júbilo e ventura e até dancei!  Agora, a fragilidade dos filamentos impedem-me de caminhar…
- Escuta…vislumbra-se folia. Impeço-te de declinares o convite! Prometem infinita diversão plena de inolvidáveis melodias… !
Complacente, anuiu presença no baile. Inebriou-se com a perspetiva de voltarem a rodopiar!
Já noite alta, alguns pares tombaram despojados no encerado parquet sobre os sedosos filamentos róseos que adornavam o chão, que nem delicadas pétalas. Era o reflexo da fadiga emanado do adorno da dama…
Regressaram entrelaçadas, exaustas…
- Sinto frio. Podes acariciar-me? Mas, por favor, toma cautela… observa quão pálida estou. O rosa desbotado no amarelo quase impercetível…   Ah, mas a macieza, essa, tal como eu, obstinadamente persiste inalterável! – afirmou trémulo o lenço
- Senhora minha, aceitas visitar-me de quando em vez ? – pergunta
- Obviamente que sim! – rejubilou a Maria José
- Abraça-me então, com carinho, por uns momentos mas volta a guardar-me. Necessito de repousar  – finalizou o lenço.


A Galega de Castro

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